domingo, 14 de maio de 2017

Ingmar Bergman



cenas de um casamento 

JOHAN - vou falar-lhe de uma coisa banal. nós somos sentimentalmente analfabetos. e esse é um fato lamentável que não diz respeito apenas a você e a mim, mas praticamente a todo mundo. nós aprendemos tudo sobre o corpo humano e sobre agricultura em pretória e sobre a raiz quadrada de pi ou raios que o parta o nome que isso tem, mas não aprendemos uma palavra sobre a alma. nós somos um zero, terrivelmente incompetentes, tanto sobre nós próprios como sobre os outros. já se fala um pouco que as crianças devem ser educadas para o humanismo, a compreensão, a coexistência e a fraternidade e todas essas palavras da moda que eu não sei mais. mas ninguém tem a ideia de que primeiro precisamos aprender alguma coisa a respeito de nós mesmos e de nossos próprios sentimentos. a respeito dos nossos medos, da nossa solidão, dos nossos ódios. nesse ponto, estamos perdidos, incapazes e cheios de má consciência e de ambições desfeitas. fazer uma criança consciente de sua alma é quase uma coisa indecente. a gente quase é considerado um velho bêbado. como é que vamos compreender os outros se nós nada sabemos a respeito de nós mesmos? você já está bocejando e, por isso, a palestra termina aqui. eu, aliás, não tinha mais nada a  dizer. você vai beber mais um conhaque e depois a gente decide como vamos fazer com essa tal de ceia.

domingo, 16 de abril de 2017

Guimarães Rosa


manuelzão e miguilim

"mas agora miguilim queria merecer paz dos passados, se rir seco sem razão. ele bebia um golinho de velhice."

...

"'o lumêio deles é um acenado de amor...' um cavalo se assustava, com medo que o vaga-lume pusesse fogo na noite. outro cavalo patalava, incomodado com seu corpo tão imóvel. um vaga-lume se apaga, descendo ao fundo do mar. - 'mãe, que é que é o mar, mãe?' mar era longe, muito longe dali, espécie duma lagoa enorme, um mundo d'água sem fim, mãe mesma nunca tinha avistado o mar, suspirava. - 'pois, mãe, então mar é o que a gente tem de saudade?' miguilim parava. drelina espiava em sonho, da janela. maria pretinha e a rosa tinham vindo também.