quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Bill Bryson



em casa - uma breve história da vida doméstica 

(...) que a maior parte da história é realmente isto: as massas humanas fazendo suas atividades comuns. Até mesmo Einstein deve ter passado grandes trechos da vida pensando nas férias, ou no que comeu no jantar, ou no gracioso tornozelo da moça que descia do bonde do outro lado da rua. São coisas desse tipo que preenchem a nossa vida e os nossos pensamentos; e, no entanto, nós a tratamos como incidentais e indignas de séria consideração. Não sei quantas horas dos meus anos de escola foram gastas estudando o Compromisso do Missouri ou a Guerra das Rosas; mas foi imensamente mais do que me incentivaram ou permitiram dedicar à história do comer, dormir, fazer sexo e tentar se divertir.
Pensei, então que poderia ser interessante escrever um livro sobre as coisas comuns da vida - finalmente observá-las e tratá-las como se elas também fossem importantes. Observando a minha casa, fiquei surpreso e um pouco chocado ao perceber como eu sabia pouco sobre o mundo doméstico ao meu redor. Sentado à mesa da cozinha certa tarde, brincando distraidamente com o saleiro e o pimenteiro, ocorreu-me que eu não fazia a menor ideia do porquê, entre todas as especiarias do mundo, temos um apego tão duradouro a essas duas. Por que não pimenta e cardamomo, digamos? 
(...) O que descobri, para a minha grande surpresa, é que tudo que acontece no mundo - tudo que é descoberto, ou criado, ou ferrenhamente disputado - vai acabar, de uma forma ou de outra, na casa das pessoas. As guerras, as fomes, a Revolução Industrial, o Iluminismo - tudo isso está lá, no seu sofá e na sua cômoda, escondido nas dobras das suas cortinas, na maciez dos seus travesseiros, na tinta das suas paredes, na água das suas tubulações. Assim, a história da vida doméstica não é apenas uma história de camas, sofás e fogões, como eu vagamente supunha, mas sim do escorbuto e do guano, da Torre Eiffel e dos percevejos, dos ladrões e de cadáveres e de mais ou menos tudo o que já aconteceu. As casas não são refúgios contra a história. É nelas que os fatos históricos vão desembocar.